Na era das redes sociais, novo papel do jornalismo

Por que produzir informações relevantes sobre a sociedade tornou-se mais necessário que nunca.
Como profissionais e blogueiros podem ser complementares.

Entrevista com diretor do Comitê de Proteção dos Jornalistas

Às vésperas do Global Media Forum, que se realizou recentemente em Bonn, a Deutsche Welle conversou com Joel Simon, o diretor-executivo do Comitê de Proteção aos Jornalistas (CPJ) – organização internacional representada este ano na conferência em Bonn, cujo tema principal é “Direitos humanos e globalização: um desafio para a mídia”.

Qual é a sua definição de jornalista?

Joel Simon: Os jornalistas existem para colher e disseminar informação de relevância para a população. Há jornalistas profissionais que fazem isso, e há pessoas que fazem isso como cidadãos. Isso vai se modificando com o tempo.

As novas tecnologias garantiram que nos dias de hoje existam um número nunca visto de jornalistas cidadãos. Na Alemanha, o jornalismo não é profissão para a qual se precise de um diploma. Qualquer um pode ser um jornalista. Nós [do Comitê de Proteção aos Jornalistas] defendemos os direitos dos jornalistas profissionais, dos freelancers e dos jornalistas cidadãos.

Os blogueiros podem ser considerados automaticamente jornalistas?

Blogueiros podem ser jornalistas. Nós usamos o bom senso para julgá-los [se podem ou não serem considerados jornalistas], se assim o quiserem. Quando estamos diante desta questão, avaliamos o blog desta pessoa. Lemos o blog no idioma original. Analisamos o contexto, como foi escrito, e julgamos a função do blog. Quase sempre chegamos a uma decisão.

Nem todos os blogs fazem jornalismo. Mas existem vários que são absolutamente jornalísticos, que condizem com o que nós entendemos por jornalismo e cujos autores têm direito de serem defendidos pelo Comitê.

Em 2009, você disse que os blogueiros encontram-se “no topo da revolução online”. Eles formam também a ápice do jornalismo moderno?

Naquela época, os blogueiros eram o centro das atenções porque o blog era o meio mais importante pelo qual a população podia ativamente participar do jornalismo. Hoje já estamos, de novo, um passo adiante. Hoje existe o Twitter, o Facebook, o Youtube e outros meios. É um processo contínuo.

A revolução online institucionaliza a habilidade da população de se engajar no jornalismo. Ela institucionaliza a capacidade [dos não profissionais] de disseminar conhecimento e escolher para qual público vai escrever o que pensa e vê. Mas estes jornalistas cidadãos não substituem profissionais com formação e experiência em meios de comunicação e investigação.

Nós precisamos de jornalistas profissionais. Eles podem se complementar com os jornalistas cidadãos. Nós lucramos quando precisamos lidar com novas fontes e métodos de coletar ou disseminar informação.

No seu censo de 2010, você documentou 145 casos de detenção de jornalistas. Deles, 69 eram jornalistas da mídia online, a maioria era blogueiros. Até que ponto a revolução online muda o trabalho do Comitê de Proteção aos Jornalistas, que luta no mundo todo pelo direito dos jornalistas de reportar sem medo?

Observe atentamente os casos. Quase todos os blogueiros detidos estão nas prisões por terem representado uma opinião. Eles escreveram comentários. Em sociedades opressivas, não existem canais oficiais pelos quais se poderiam expressar opinião ou criticar o governo. Portando os afetados [pela repressão] optaram por blogs ou outras mídias sociais. Os governos atingidos perceberam rapidamente que os novos jornalistas cidadãos eram uma ameaça para eles e reagiram.

China e Irã são excelentes exemplos. São os países que mais aprisionam jornalistas no mundo. O fato é que os governos se sentem ameaçados pela crescente habilidade das pessoas de coletar e disseminar informação em sociedades reprimidas. Nos últimos meses, pudemos acompanhar isso no norte da África e no Oriente Médio. Para defender seus interesses, os governos reagiram às ameaças sempre com novas represálias.

Quem melhor pode relatar sobre a violação de direitos humanos: um jornalista cidadão, como blogueiro, ou um jornalista profissional apoiado por um grande meio de comunicação?

Acredito que um reforça o outro. Os blogueiros alcançam quase sempre um publico mais selecionado. Chegam aos leitores que se interessam pelo tema abordado. Se compararmos, os meios de comunicação tradicionais alcançam a grande massa; são predominantemente destinados ao público em geral.

O trabalho do blogueiro, ou dos outros jornalistas cidadãos nas redes sociais, estimula o trabalho dos profissionais e da mídia. Estes podem publicar a situação para um público ainda maior.

A capacidade dos jornalistas cidadãos de se infiltrar no que está acontecendo, documentar secretamente a situação e depois publicar as informações é uma nova ferramenta de incalculável valor para os meios de comunicação profissionais. O jornalismo feito por cidadãos não profissionais melhora e reforça o jornalismo profissional dos meios tradicionais de comunicação.

Jornalista é necessário

Joel Simon encerra a entrevista dizendo: “Mais do que nunca, este mundo precisa de nós jornalistas”. Ele acrescenta que os jornalistas têm um papel indispensável: “Embora eu também acredite que as forças obscuras como os governos opressores, os bandos criminosos e os grupos radicais farão de tudo para prejudicar o trabalho dos jornalistas”.


Joel Simon dirige o Comitê de Proteção aos Jornalistas, fundado em 1981. Sediado em Nova York, a organização luta pela liberdade de imprensa, engajando-se pelos direitos dos jornalistas de fazer suas reportagens sem medo. O diretor também escreve regularmente como especialista em mídia para o New York Times, Washington Post, Columbia Journalism Review e World Policy Journal.

Por Sandra Petersmann, na Deutsche Welle

———————-

Creative Commons License
Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons

© Copyleft
É permitida a reprodução do conteúdo, desde que citados autor e fonte.

O que muda para o profissional de comunicação

Agora que as fontes também publicam, começa a discussão das regras para a gestão das mídias digitais, legais e legitimas, que estão à disposição da comunicação empresarial.

Importante artigo de Paulo Nasser ( a seguir ) publicado recentemente traz à luz do embate aquilo que de maneira velada já se avolumava por trás de hrefs e tags: uma irreversível revolução que se por um lado nos incomoda como humanos presos a nossos hábitos, costumes e padrões, deve nos instigar como humanos e profissionais que somos para alçar novos vôos e conquistar novas esferas.

Não são apenas acionistas e famílias proprietárias de mídia que não gostam do que estão vendo: novas mídias diretas, que corroem poder, faturamento, jornalismo commodity e a desmoralizada agenda setting – mas que também levam à desvalorização dos profissionais de comunicação como um todo.

Este é um fenômeno que atinge a todos nós.

Com a democratização da tecnologia e a necessidade de se obter receita em tempos de crise, todo micreiro e photoshopeiro virou designer, diretor de arte e o que mais for preciso.

Bem, do Word e da saga da valorização dos redatores nem se fala.

Pequenas agências lutam para se diferenciar de free-lancers, muitos dos quais bons profissionais de conceituadas agências médias-grandes que completam o salário, reduzido pelo excesso de oferta.

Afinal, como justificar valor no meio disto tudo – como empresa ou profissional?

O caminho passa, necessariamente, por uma redefinição de atuação. Não se pode continuar no mesmo passo, no mesmo caminho, se as configurações externas se alteraram. E da maneira com que se alteraram.

Como toda mudança, há o período do despertar da sonolência do antigo padrão, momentos de confusão, desnorteamento, medo, acusações mútuas entre partes que não são opostas de fato.

Penso que se deva acalmar os ânimos e com sabedoria contemplar o mercado, mostrando que há sim espaço para todos, dentro, logicamente, de um mínimo de ética e organização.

A ética passa primeiramente por parte dos detentores dos meios de produção, dos antigos barões da mídia e donos de empresas e agências, que não devem reagir impensadamente, baixando salários e expectativas.

A quantidade nunca vencerá a qualidade e esta nova onda não se sustentará sozinha, mesclar-se-á ao que havia de melhor, forjando uma terceira onda, mais estável, onde empresas e bons profissionais se encontram na crista da onda e da pirâmide, cujas bases são a produção descentralizada e informal, a qual terão o prazer de agregar, avaliar, rotular, distribuir e comentar, realimentando o fluxo contínuo de uma sociedade da informação cada vez mais conectada e menos marginalizada.

Enquanto isto, damos um jeito para não ficarmos vendidos em meio às negociações pequenas do cotidiano; certos de que fazemos parte de um grande momento da história humana.

Contemplar a vida sobre este aspecto lhe dará um novo ânimo para a próxima reunião.

Evidencie este valor: visão, planejamento, estratégia e poder de condução estarão cada vez mais em voga no mar de colaboração.

Rumamos para a explosão do potencial da informação, que é a consciência. As marcas, empresas e profissionais que entenderem isto estarão a frente deste processo.

Por Klaus Denecke-Rabello – consultor, diretor de comunicação, professor de comunicação digital e consultor da campanha nacional de acessibilidade. Escreve blogs sobre desenvolvimento sustentável e filosofia e acredita no papel transformador das marcas.


Creative Commons License
Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons

© Copyleft – É permitida a reprodução desde que citados autor e fonte.

“A Petrobras criou o seu blog e mostrou um caminho sem volta e sem filtros”, avalia Nassar

Os intermediários parecem perder poder, pelo menos no mundo da comunicação. Vê-se enfraquecerem os que fazem o meio de campo entre as chamadas fontes de informação e a sociedade, os veículos de comunicação de massa tradicionais – jornais, revistas, rádios, televisões filhos de uma era em que para se comunicar de maneira ampla eram necessários aparatos tecnológicos identificados a olho nu: grandes antenas retransmissoras ou grandes instalações industriais para abrigar impressoras enormes. Propagandear, vender, entreter, comunicar era sinônimo de especialista, muita máquina e muito fio.

A comunicação agora é intensiva, muito mais leve, mais software. Dispõe de grande oferta de mídias novas, inimigas de especialistas e intermediários. Hoje você acorda com o canto dos blogs e o trinado do twitter.

A era exclusiva do rádio, da televisão e da imprensa escrita passou. O agora comunicativo são todas as eras mais o tempo do Eu-mídia, em que pessoas, empresas e instituições são donas das suas próprias mídias. Um tempo de relações públicas intensivas, em que todos são jornalistas, publicitários e relações-públicas.

Acionistas e famílias proprietárias de mídia do tempo em que poucos eram exclusivamente os emissores de mensagens endereçadas para milhões de receptores, passivos e infantilizados, não gostam do que estão vendo: as novas mídias diretas, que corroem poder, faturamento, jornalismo commodity e a desmoralizada agenda setting.

Hoje, no extremo, todos podem influenciar todos. Afinal, agora, sem intermediários, milhões podem expor seus pontos de vista nesse mundo de controvérsias ambientais, econômicas e sociais. Não há mais unanimidade. Quem não é otimista ou vive uma crise financeira ou profissional vê o caso como barbárie digital.

A Petrobras criou o seu blog e mostrou um caminho sem volta e sem filtros. Logo, muitas outras empresas e instituições repetirão a iniciativa. Diante da mídia da fonte, as redações terão que fazer jornalismo com competência para ser crível: selecionar informações, interpretar e opinar com qualidade. Apenas começa a discussão das regras para a gestão dessa e de outras mídias digitais, que são legais e legitimas, e estão à disposição da comunicação empresarial. Mãos à obra: discutir democraticamente uma nova deontologia, porque McLuhan tinha razão: “o meio é a mensagem”.

Por Paulo Nassar – professor da Escola de Comunicações e Artes, da Universidade de São Paulo (ECA-USP).
Diretor-presidente da Associação Brasileira de Comunicação Empresarial (ABERJE). Autor de inúmeros livros,
entre eles O que é Comunicação Empresarial, A Comunicação da Pequena Empresa, e Tudo é Comunicação.


Creative Commons License
Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons

© Copyleft – É permitida a reprodução desde que citados autor e fonte.

Centro Knight lança ‘Como escrever para a web’ em português

O Centro Knight para o Jornalismo nas Américas da Universidade do Texas em Austin acaba de publicar a edição eletrônica em português do livro Como escrever para a Web, escrito pelo jornalista colombiano Guillermo Franco e traduzido pelo jornalista brasileiro Marcelo Soares.

As edições em português e espanhol podem ser baixadas em formato PDF, na íntegra e gratuitamente, do website do Centro Knight: http://knightcenter.utexas.edu/como_web.php. Desde a sua publicação em dezembro de 2008, a edição em espanhol já foi baixada quase 13 mil vezes.

Como escrever para a Web é o segundo guia de habilidades para jornalistas que o Centro Knight publica. Em dezembro de 2007, o Centro Knight lançou edições eletrônicas em espanhol e português do livro Jornalismo 2.0: Como sobreviver e prosperar, Um guia de cultura digital na era da informação, escrito pelo jornalista americano Mark Briggs.

As edições em português, espanhol e inglês podem ser baixadas em formato PDF, na íntegra e gratuitamente, da página do Centro Knight. Este livro já foi baixado quase 17 mil vezes desde a sua publicação.

O novo livro de Franco traz exemplos práticos sobre como escrever para publicações online e como pesquisar a partir de outras fontes. Ele o considera não somente um manual, mas um ponto de partida para um guia mais abrangente sobre como escrever para a Web, com contribuições de jornalistas de toda a América Latina e do Caribe.

O tradutor Marcelo Soares é membro fundador da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (ABRAJI), e colaborador do blog do Centro Knight. Soares viu a necessidade de uma edição em português do livro.

“No jornalismo online brasileiro, vejo mais copy-paste do que tentativas bem-pensadas de como apresentar informação online. Nem os links, que são o básico da estrutura da Internet, costumam ser usados pra adicionar uma camada extra de informação. Então, o jornalismo brasileiro pode aproveitar muito o livro do Guillermo se os editores dos jornais online resolverem usá-lo como alimento pra pensar. O livro também tem várias dicas práticas sobre como fazer coisas novas”, diz Soares.

Na introdução do seu livro, Franco escreve: “Ao buscar informação sobre esse assunto na Web, livros e entrevistas que realizamos, nos deparamos com todo tipo de visão, mas privilegiamos as que estavam respaldadas por pesquisas”.

“Ao revisar este documento em seu conjunto, dois nomes ganham relevância (pelo número de vezes em que são citados): Poynter Institute e Jakob Nielsen, diz Franco. “Este manual é uma homenagem aos dois, mas em especial a este último, uma referência obrigatória em temas de usabilidade e Internet, que compartilha seu conhecimento generosamente em seu website”.

Franco tem 23 anos de experiência jornalística. Ele tem dedicado seus últimos oito anos ao jornalismo digital e à Internet. Ele desenvolveu toda a sua carreira na Casa Editorial El Tiempo (CEET), proprietária do jornal diário El Tiempo e do eltiempo.com, o site com maior tráfego de audiência na Colômbia.

De 2000 a 2008, Franco trabalhou como gerente de conteúdo de novas mídias no CEET e como chefe de redação do eltiempo.com. Ele foi responsável pela estratégia de conteúdo de todos os sites que pertencem à organização.

O Centro Knight para o Jornalismo nas Américas foi criado pelo professor Rosental Calmon Alves na Escola de Jornalismo da Universidade do Texas em Austin em agosto de 2002, graças a uma generosa doação da Fundação John S. e James L. Knight.

Em 2007, o Centro Knight recebeu novo financiamento de cinco anos da Fundação Knight para reorientar seu trabalho como um centro de treinamento em mídias digitais para o jornalismo latino-americano e caribenho, expandindo seus esforços para servir como incubadora de novas organizações de jornalismo.


Informações coletadas e divulgadas no site Centro Knight para o Jornalismo nas Américas
– Knight Center Of Journalism in The Americas – University Of Texas At Austin

Creative Commons License
Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons

Emprego : Curso profissionalizante ou Curso Superior ?

Os mais escolarizados têm mais acesso à qualificação profissional

Pesquisa realizada para este primeiro Boletim Fundap-Cebrap mostra que o ensino profissionalizante e a qualificação profissional são tidos pela população como elementos fundamentais para o acesso ao mercado de trabalho, mas a oferta desses cursos é reduzida e, paradoxalmente, privilegia as camadas mais escolarizadas, em especial a que tem ensino superior. Os segmentos da população de menor renda e escolaridade, precisamente aqueles que mais precisariam do ensino profissionalizante para ingressar ao mercado e trabalho, não são atendidos pelas principais instituições que estruturam a oferta de qualificação. Trata-se de um quadro de baixa oferta e desigualdade de oportunidades que evidencia os grandes desafios que se colocam para as políticas públicas de educação, emprego e desenvolvimento social.
Exemplo da visão positiva com relação aos cursos profissionalizantes é o fato de 52,5% dos entrevistados terem concordado com a afirmação de que, hoje em dia, um curso profissionalizante é mais importante do que um curso universitário para a inserção no mercado de trabalho. A afirmação se sustenta como percepção majoritária em todos os estratos da população, especialmente entre aqueles com escolaridade até o ensino médio incompleto. Isso sugere certo esgotamento do curso superior como horizonte desejável para amplos segmentos da população.
Mas, em forte contraste com importância atribuída ao ensino profissionalizante, apenas 21,2% declararam ter tido acesso a alguma forma de qualificação nos últimos cinco anos e apenas 8,9% dos pesquisados estão matriculados ou fizeram um curso dessa natureza nos últimos 12 meses. A pesquisa, realizada em setembro na cidade de São Paulo, ouviu 1.122 pessoas com 18 anos ou mais. A amostra foi composta levando em consideração o perfil etário e representatividade socioeconômica em relação ao conjunto da população.
A quase totalidade (95,5%) dos ouvidos declarou que os cursos de qualificação ajudam a encontrar, melhorar ou preservar o trabalho e a renda. Uma elevada proporção (46%) disse ter a intenção de fazer um curso desse tipo em breve. Dos que se declararam desempregados, 56,1% expressaram a vontade de fazer um curso de qualificação em breve, 29,5% dos ocupados e 26,4% dos inativos declararam essa mesma intenção.
A população que atribuiu uma maior importância aos cursos de qualificação e ensino profissionalizante em relação aos cursos universitários corresponde majoritariamente à parcela com rendimento mais baixo – 42,1% tinham até um salário mínimo de renda familiar per capita; 36,2%, de 1 a 3 salários mínimos; 10,3%, de 3 a 5 salários mínimos; 7,4% , de 5 a 10 salários mínimos; e apenas 3,3%, mais de 10 salários mínimos.
O padrão se repete para escolaridade. Dentre os pesquisados com 0 a 3 anos de escolaridade, apenas 24,6% discordam da afirmação de que cursos profissionalizantes são mais importantes do que cursos universitários, sendo que 46,2% dos que possuem 15 anos ou mais de escolaridade discordam dessa afirmação, conforme mostra o gráfico abaixo.

Dados da Fundap
Dados da Fundap

boletim cebrap-fundap

Barreira da escolaridade

A escolaridade é o fator que mostra mais claramente a desigualdade: 41% dos que possuem ensino superior fizeram algum curso nos últimos cinco anos, ao passo que menos de 9% daqueles com baixa escolaridade (mais de 3 a 7 anos de estudo) tiveram acesso à qualificação profissional. O gráfico, abaixo, mostra a relação direta entre acesso a cursos de qualificação e escolaridade.

boletim cebrap-fundap

A pesquisa apontou uma escala de valorização das instituições que oferecem cursos de qualificação profissional. Os cursos do chamado Sistema S (Sesc, Sesi, Senai etc.) são os mais apontados como de melhor qualidade, em contraste com os cursos de associações comunitárias, escolas especializadas, igrejas, ONGs e comércio de varejo (perfumarias, mercados etc.), que oferecem principalmente “cursos livres”, em geral não submetidos a regulamentações específicas e/ou não credenciados.
Parcela expressiva dos entrevistados (41,5%) afirmou que faria um curso de qualificação no Sistema S – as faculdades ou universidades aparecem em segundo lugar, com 25,7%. A metade dos pesquisados que tiveram experiência com o Sistema S e com o ensino superior revelaram-se satisfeitos com os cursos que realizaram, pois voltariam a estudar nessas entidades. Em contrapartida, dos entrevistados que fizeram cursos de qualificação em associações, igrejas, no comércio ou em escolas especializadas (como de informática e línguas), nenhum declarou que voltaria a fazer seu curso em uma dessas entidades. Nesses casos, as escolhas se dariam no sistema S, nas faculdades s e em cursos que, no entendimento dos entrevistados, poderiam ser oferecidos pelo governo. O gráfico abaixo detalha essa questão.

boletim cebrap-fundap

Há também uma percepção dos benefícios obtidos em termos de inserção no mercado de trabalho associada às instituições que oferecem os cursos. O gráfico abaixo mostra que os melhores benefícios em termos de obtenção de emprego estão associados a cursos do Sistema S e de escolas do ensino superior. Mostra também que os efeitos percebidos variam conforme o tipo de instituição: universidades aparecem mais associadas à promoção de emprego, sugerindo se tratar de um público que estuda enquanto trabalha; obviamente, as opções de qualificação oferecidas por firmas e sindicato guardam maior relação com a preservação do emprego. Por sua vez, e a despeito de sua baixa qualidade, os “cursos livres” mostram certa associação com o incremento de renda.

boletim cebrap-fundap

Os mais excluídos
O cruzamento das percepções de qualidade com as condições de renda e escolaridade mostra um quadro particularmente perverso em termos de acesso aos melhores cursos. São justamente os mais pobres, com menos escolaridade e com necessidade premente de qualificação que tendem a cursar as instituições menos prestigiosas – 44% dos que fizeram seu curso em associações, igrejas, comércio e escolas tinham até um salário mínimo como renda familiar per capita.
Assim não é por acaso que essa população insatisfeita com a qualidade revele uma demanda mais elevada por cursos oferecidos pelo governo – a metade da população que realizou cursos menos prestigiosos faria algum curso oferecido pelo poder público. Nesse sentido, a opção de vir a realizar um curso ofertado pelo governo refere-se, mais do que ao conhecimento de cursos específicos dessa natureza, ao desejo dessa população de realizar um curso gratuito e à confiança na qualidade dessa opção por oposição à sua experiência nos “cursos livres”. De fato, a pesquisa mostrou que há um grande desconhecimento dos programas orientados a ampliar o acesso da população à qualificação profissional. Somente 20,5% dos pesquisados declararam conhecer algum programa, mas mais da metade deles não sabia ou não respondeu qual era o programa.

A manifestação de interesse em realizar cursos de qualificação/capacitação profissional está relacionada com os benefícios percebidos pela população em termos de inserção no mercado de trabalho, sobretudo, da população mais vulnerável em termos socioeconômicos. A maioria dos ouvidos (61,7%) declarou algum efeito percebido dos cursos em termos de acesso ao mercado de trabalho, promoção no cargo ou aumento da renda. Além disso, da população que declarou que o curso ajudou a obter emprego, 80% estavam ocupados.
Um aspecto importante está relacionado à empregabilidade da população mais pobre e menos escolarizada que teve acesso à qualificação profissional.
Como se observa no gráfico, a seguir, do grupo de 4 a 7 anos de estudo e que fez algum curso nos últimos cinco anos, 87,5% estavam ocupados, ao passo que os que nunca fizeram e tinham o mesmo nível de escolaridade, apenas 53,4% estavam ocupados. Trata-se de um forte indicador de que a qualificação é elemento fundamental na melhoria da inserção de trabalho da população em piores condições sociais. Conforme mostrado no último gráfico, a relação positiva se mantém, embora atenuada, para indivíduos de escolaridade média. No grupo de escolaridade de 8 a 10 anos de estudo, a proporção de indivíduos que estavam ocupados e fizeram curso superava a proporção dos que não tinham feito.

boletim cebrap-fundap

boletim cebrap-fundap

Conclusões
A grande tarefa que se coloca para as políticas voltadas ao setor é, portanto, a ampliação da oferta conjugada a melhores condições de acesso para as camadas da população em situação menos favorável em termos de renda e escolaridade. Se os desafios podem ser facilmente resumidos, sua solução não é trivial.
Com relação à escolaridade, é importante notar que ela representa a maior barreira, pois a qualificação de qualidade pressupõe um determinado nível escolar para sua assimilação. Isso ressalta a necessidade de o ensino profissionalizante guardar uma estreita relação de complementaridade com o ensino básico. Mas não se pode ignorar que há contingentes importantes da população com baixa escolaridade e renda e que necessitam de alguma qualificação para sustentar suas famílias. Para esses, é necessário que haja uma oferta de qualificações possíveis, pouco complexas, porém eficazes para habilitar a uma ocupação. Uma política desse tipo poderia visar a ampliação do acesso dos menos escolarizados às boas instituições de treinamento que, por sua vez, poderiam ser induzidas a criar programas especiais para esses segmentos, inclusive complementados pelo ensino supletivo de educação básica. O ideal é que o desenho de tais programas conte com parcerias.
Os desafios, não há dúvida, são grandes. A diversidade de públicos e instituições e das formas como ambos se relacionam com o mercado aponta para a inviabilidade de pensar em estratégias únicas. Mas é preciso ressaltar que o foco dado pelo governo do Estado de São Paulo para o ensino profissionalizante e a qualificação profissional segue na direção correta do atendimento de uma demanda social prioritária. O aumento de vagas nos cursos do Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza, a ampliação do número de Faculdades de Tecnologia (Fatecs) e o Programa Estadual de Qualificação Profissional (PEQ) representam, sem dúvida, um avanço valioso e uma referência em nível nacional.

Instituições oferecem curso de divulgação científica

Jornalistas e outros profissionais que atuam na área de divulgação científica têm, já no início de 2009, mais um curso de especialização (lato sensu). O Curso de Especialização em Divulgação da Ciência, da Tecnologia e da Saúde é resultado da iniciativa do Museu da Vida da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Casa da Ciência da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e Fundação Cecierj, com apoio da Rede de Popularização da Ciência e da Tecnologia da América Latina e do Caribe (Red-Pop), da Associação Brasileira de Centros e Museus de Ciência e da Associação Brasileira de Jornalismo Científico (ABJC).

O curso se destina a museólogos, comunicadores, jornalistas, cientistas, educadores, sociólogos, cenógrafos, produtores culturais, professores de ciências licenciados (nível superior) e demais profissionais que atuam, seja no âmbito prático ou acadêmico, na área da divulgação da ciência, da tecnologia e da saúde, da comunicação pública da ciência e da popularização científica.

O período de inscrição é de 26 de janeiro a 6 de março. O processo de seleção ocorre entre 16 e 20 de março. As aulas iniciam em 30 de março e serão ministradas no Museu da Vida, na avenida Brasil, 4365, em Manguinhos, Rio de Janeiro.

Informações sobre o curso podem ser obtidas no site http://www.museudavida.fiocruz.br/lato.

Creative Commons License
Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons

O Jornalismo e a verdade na qual queremos crer

“A imprensa pode causar mais danos que a bomba atômica. E deixar cicatrizes no cérebro.” (Noam Chomsky)

O jornalista estadunidense Chip Rowe publicou certa vez na revista American Journalism Review uma reportagem sobre a relutância dos profissionais de imprensa em dar entrevistas aos seus colegas de profissão: “As pessoas da comunidade jornalística têm as mesmas suspeitas do público de que suas palavras serão distorcidas”, afirmou Rowe. Na mesma linha, seu conterrâneo David Shaw citou – referindo-se ao mesmo tema – uma história dos tempos em que cobria a mídia para o Los Angeles Times, quando um editor do próprio veículo se recusou a conversar com ele sobre uma pauta, estendendo a proibição aos seus repórteres.

O professor Ken Metzler, que durante vinte anos estudou as relações entre fontes e repórteres na Universidade do Oregon, fez o seguinte diagnóstico sobre este desconforto: “A mídia comete tantos erros que os repórteres sentem-se paranóicos para dar entrevistas; sentem-se desamparados.” Outra explicação para o mal-estar entre colegas de ofício foi dada por Jack Shafer: “Eles vivem de encher lingüiça. Então sabem o que vai na lingüiça.”

Uma influência perniciosa e constante

Citados os exemplos acima – pinçados de um artigo publicado pelo Instituto Gutenberg (autor não especificado) -, seria de bom tom perguntar: se nem os jornalistas confiam nos jornalistas é de se esperar que a sociedade o faça? Apesar de provocativa e abrangente dentro do contexto em que as afirmações anteriores foram feitas, a questão tem fundamento. Afinal, que verdades são estas que trazemos à tona diariamente? As do leitor? Do dono do jornal? Do poder político-econômico por detrás dele? Muito se fala de ética, mas podemos perguntar também qual a ética que prevalece na selva das redações?

Jornalista, professor da Escola de Comunicações e Artes (ECA) e pesquisador do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (USP), Eugenio Bucci sustenta, no artigo “O que significa acreditar na imprensa” (onde dá continuidade a reflexões feitas no artigo “O patriotismo do consumo”, ambos neste Observatório), que “não há canal mais adequado para dialogar com a sociedade do que a instituição da imprensa”. Diz, também, respondendo a alguns de seus leitores que contestaram a credibilidade dos jornais, que acreditar na imprensa não significa crer passivamente em tudo o que os veículos publicam, mas sim, participar ativamente do que nela é discutido. Para Bucci, “fora da imprensa vista como instituição, não existe um fórum democrático para o florescimento de uma opinião pública bem fundamentada e vibrante”. E completa: “Acreditar nela significa ter disposição para dentro dela formular, apoiar e criticar pontos de vista.”

Não me sinto capacitado teoricamente para confrontar o cerne da argumentação de Bucci. Desenvolvo estas mal traçadas linhas, imbuído, isso sim, de um sentimento de impotência diante do que hoje se apresenta como jornalismo – sentimento que, penso, é compartilhado por muitos. E assim, tento raciocinar sobre o que diz o professor em seu artigo, por exemplo, quando expõe as diferenças básicas entre a instituição da imprensa e outras formas de comunicação. “A publicidade é uma prática nitidamente comercial, ainda que se beneficie legitimamente da liberdade de expressão. Já a imprensa é uma prática não-comercial, ainda que notícias também possam circular como mercadorias.” Ocorre que, analisando o mainstream, já não me sinto seguro para discernir o que é jornalismo e o que é publicidade, dada a perniciosa e constante influência do poder político-econômico sobre a pauta.

O “papel secundário de correligionária”

Uma tarde dedicada à leitura dos “jornalões”, das revistas semanais e dos blogs autorais que proliferam na web pode ser uma experiência e tanto para reforçar este sentimento de desorientação. A revista x acusa a revista y de editorializar sua pauta. A revista y responde dizendo que a revista x vive da publicidade governamental. Em meio a isso, colegas entram em um tiroteio ideológico cujo objetivo é mostrar, através de artigos bem delineados e de dossiês, que tal setor da mídia não é digno de confiança. Como resposta, os acusados iniciam campanhas de desconstrução profissional dignas de uma KGB (ou de uma CIA, para não soar ideológico de minha parte).

Bem, os mais argutos podem argumentar que a conclusão sobre esta ou aquela afirmação deve ser resultado do cabedal de informação de cada um. Ocorre que, em meio a esta tempestade de informação na qual se transformou o jornalismo contemporâneo, dominar um leque tão vasto de assuntos complexos é tarefa hercúlea até para jornalistas, estes profissionais que se arvoram no direito de dar pitaco sobre as mais diversas áreas, mas que se arrepiam quando o assunto adentra sua seara. Se, é assim para nós, imagine para o leitor.

Em 2005, o jornalista Luciano Martins Costa, no artigo “A partidarização oculta os problemas reais”, neste Observatório, perguntava: “A imprensa ainda é um instrumento confiável para a interpretação da realidade nacional?” Tratando especificamente do caso “mensalão” e de sua abordagem na mídia, ele finaliza com uma avaliação que pode, no entanto, ser ampliada para esta guerra de confiabilidade na qual estão imersos hoje os muitos atores da imprensa no Brasil. Diz ele:

“Difícil aceitar que a imprensa jogue deliberadamente um jogo de esconde-esconde com a opinião pública, mas não é complicado entender que, depois de haver enfrentado uma crise de quase uma década, durante a qual perdeu muitos colaboradores e foi obrigada a firmar compromissos com credores, ela possa ter se tornado mais vulnerável à tentação de se manter alinhada a grupos de poder cujas premissas, afinal, não teria dificuldade para assimilar. Problema mesmo é constatar que a imprensa abdicou de participar da formulação de grandes estratégias sociais e políticas para se resignar ao papel secundário de correligionária na tarefa de fazer muito barulho para não revelar o essencial.”

Assessoria do poder político-econômico

Em recente entrevista ao site do Instituto Humanitas Unisinos (IHU On-Line), o professor Erick Torrico Villanueva, diretor da pós-graduação em Comunicação e Jornalismo da Universidade Andina Simon Bolívar, disse que a crise no setor deriva da desconfiguração de suas práticas e princípios em prol de uma vertente onde o fator comercial é o que impera. Entre as causas e conseqüências desta inversão de valores e objetivos, Villanueva cita o desaparecimento da informação de interesse do público dos espaços de notícias na televisão e no rádio; o esvaziamento do conteúdo básico das notícias; a tendência do noticiário em gerar incerteza e alarme ao invés de informar; e a busca, pela imprensa, em assimilar forma e conteúdo dos padrões dos meios audiovisuais que desvirtuam a atividade jornalística.

Na introdução do livro Imprensa na berlinda – a fonte pergunta, de Norma S. Alcântara, Manual Carlos Chaparro e Wilson Garcia, os autores, lembram com propriedade Luiz Beltrão, que no livro Jornalismo interpretativo acentuou a necessidade de conhecer a fonte e seus propósitos: “Conhecer a fonte é distinguir os propósitos do sujeito promotor da ocorrência, ou as intenções do intermediário ou do testemunho, de quem (pessoa ou instituição) fornece dados mediante os quais se mede o peso do acontecimento noticiável. Sem esse prévio conhecimento da política informativa da fonte, sem essa atividade cognitiva fundamental, não poderá o comunicador da informação de atualidade distinguir, na maré das circunstâncias e ângulos que concorrem para torná-los visíveis e desapercebidos, os autênticos valores e aspectos com que irá preencher as lacunas, os vazios da informação, habilitando-o a dar à mensagem aquela transparência e complementação, sem a qual o receptor continuará mal informado ou, pior ainda, passível de trocar seu status do titular do direito de ser informado pelo de tutelado sem poder ou capacidade decisória.”

Muito correto. A falta de atenção ou entendimento a respeito desta importante reflexão sobre o fazer jornalístico tem condenado muitos jornalistas e veículos de comunicação a um papel de assessoria de imprensa do poder político-econômico. Um exemplo recente deste comportamento foi retratado no artigo “Imprensa fecha os olhos e fortalece homofobia em MS”, publicado neste Observatório no dia 17 de dezembro.

Democracia e liberdade de expressão

Mas, pinçando desta reflexão o argumento de fundo, não terá a população o mesmo direito de conhecer a fonte e seus propósitos – no caso, os veículos de comunicação – ao folhear seu jornal predileto ou ao assistir do sofá da sala ao telejornal de sua preferência? São dados ao consumidor de notícia os meios de conhecer o que de fato há por detrás das manchetes?

Uma frase de Chaparro, citada na introdução do livro supracitado, também poderia ter sua construção adaptada. “Quando o jornalismo se acomoda no aconchego das fontes organizadas e foge dos maus cheiros que atormentam os desprotegidos, ele próprio começa a cheirar mal”, diz ele. Da mesma forma o leitor/telespectador não cheira melhor ao engolir a notícia como verdade absoluta. E se não é isso o que está ocorrendo, então, por favor, mehr licht!

De fato, há argumentos para todos os lados. Pode-se dizer que a maioria acredita piamente e confia no que lê e ouve. Pode-se, também, dizer que não, que a população está mais consciente, mais propensa a questionar a notícia, a interagir com os veículos de comunicação e – como pediu Bucci – “participar ativamente do que neles é discutido”. Há, inclusive, pesquisas para todos os gostos.

Um destes estudos – divulgado neste ano – é o Latinobarómetro, promovido anualmente pelo Economist, abordando o pensamento político dos cidadãos latino-americanos. O levantamento, conduzido no Brasil pelo Ibope, concluiu, entre outras coisas, que apenas 44% dos brasileiros acreditam que “a democracia garante a liberdade de expressão sempre e em todas as partes”. Ficamos em penúltimo lugar entre os países latino-americanos, à frente apenas da Guatemala (com 42%) e 36 pontos percentuais atrás do Uruguai, primeiro colocado entre os que atribuem à democracia um papel de garantia para a liberdade de expressão.

Vender gato por lebre

Estes mesmos brasileiros que, segundo o Latinobarómetro, disseram que não se importariam em viver sob um governo não democrático desde que este resolvesse problemas econômicos (57% dos entrevistados) e elegeram o rádio como veículo de comunicação mais confiável (64%), seguido pelos jornais (62%) e pela TV (60%). O Brasil aparece, na mostra patrocinada pelo Economist, em segundo lugar entre os países latino-americanos que mais confiam nestes veículos de comunicação, sempre acima da média apresentada pelos demais países pesquisados (55% para rádios, 51% para TV e 48% para os jornais).

Outra pesquisa otimista foi realizada pela multinacional de relações públicas Edelman, segundo a qual 64% dos brasileiros consideram a mídia a instituição mais confiável. A Edelman revelou ainda que 71% dos entrevistados julgam ser confiáveis os artigos publicados por revistas especializadas em negócios. No Brasil (a pesquisa foi realizada em 18 países), foram ouvidas 150 pessoas com idade variando entre 25 e 64 anos, entre outubro e novembro de 2007.

Pouco divulgado, no entanto, foi o perfil das 150 pessoas ouvidas pela empresa. Além do número muito aquém do desejado para uma pesquisa que pretendia traçar um perfil nacional (segundo quis fazer parecer o jornal O Globo), os entrevistados foram gente considerada pela Endelman “líderes de opinião”: com curso superior, pertencentes aos 25% detentores do maior nível de renda por domicílio e com grande interesse em assuntos relacionados à mídia, à economia e aos negócios públicos. Trata-se, portanto, de uma amostra de parte da elite brasileira.

Para os que se aventuraram no link intitulado “segundo quis fazer parecer o jornal O Globo” ou já estavam por dentro das maquinações dos Marinho para vender gato por lebre, pergunto: se nosso jornalismo (ou parte importante dele) se esforça por noticiar uma informação incorreta sobre seus próprios níveis de aceitação popular, o que fará com outras notícias de interesse político-econômico?

Conhecer e entender o leitor

No contraponto está, por exemplo, a pesquisa realizada em 2006 pelo Instituto GlobeScan para a BBC, a Reuters e o The Media Center (no Brasil, o trabalho foi realizado pela GfK Indicator, que ouviu mil adultos de nove regiões metropolitanas – Belém, Belo Horizonte, Curitiba, Fortaleza, Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro, Salvador e São Paulo – no período de 16 a 22 de março). O levantamento revelou que, no Brasil, mais da metade dos entrevistados (55%) não confia nas informações obtidas através da mídia. Entre todos os países pesquisados, esse percentual só não foi maior do que o obtido na Alemanha (57%).

Além disso, a pesquisa revelou que o Brasil é o país onde as pessoas estão mais descontentes com a sua própria mídia, segundo os seguintes fatores: a mídia exagera na cobertura das notícias ruins (80%); os leitores raramente encontram na grande mídia as informações que gostariam de obter (64%); não concordam que a cobertura da grande mídia seja acurada (45%); declaram ter trocado de fonte de informação nos 12 meses anteriores por terem perdido a confiança (44%).

Durante o evento “Mitos e Verdades do Brasil de Hoje – a Visão da Mídia”, realizado em São Paulo no dia 27 de novembro, Otavio Frias Filho, da Folha de S.Paulo, disse que, para que os jornais sobrevivam, é preciso que eles conheçam e entendam seu leitor, e admitiu que a distância entre o que a imprensa oferece e o que os leitores querem ler é imensa.

A busca da “verdade até a morte”

Mas afinal, o que quer o leitor? Ao que parece, ninguém sabe ao certo. Analisando o evento (do qual também participaram Ricardo Gandour, do Estado de S.Paulo, e Josemar Gimenez, do Correio Braziliense), Luciano Martins Costa diz o seguinte (no artigo “Um melancólico olhar para dentro”, neste Observatório):

“Os três representantes do grupo que se costuma qualificar como `a grande imprensa´ não deram demonstração de otimismo quanto ao futuro dos jornais. Também deixaram a impressão de que os jornais que saem de suas impressoras não são aqueles que eles gostariam de ver impressos. Muito do que expuseram como opiniões suas se opõe diametralmente ao que seus diários publicam. A imagem que deixaram na platéia de convidados foi a de uma melancolia profunda, como a dos velhos elefantes que se encaminham lentamente para o cemitério.”

A análise dos três publishers não é diferente da minha ou da de milhares de jornalistas perdidos nos descaminhos da profissão. Alguns têm mais poder de decisão que outros, mas todos nós estamos mergulhados até o pescoço em uma pantomima na qual fingimos que fazemos jornalismo enquanto a população finge que acredita nisso.

Talvez, como sugeriu monsenhor Paul Tighe, secretário do Pontifício Conselho das Comunicações Sociais do Vaticano, tenhamos que recorrer à ética e à incessante busca da “verdade até a morte” para entendermos, de fato, o que quer o leitor e o que queremos nós, jornalistas.

Texto de Victor Barone.

Creative Commons License
Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons

Estamos próximos mesmo de uma Nova Era ?


A Globalização é um fenômeno galopante e as intersecções entre culturas de todo o planeta estão cada vez mais presentes em nosso cotidiano. Pesquisa, Arte e Negócios já operam em um nível mundial, sofrendo impacto de um intercambio – muitas vezes – imediato de informações e conhecimento.

Contudo as salas de aula em todos os níveis de ensino no Brasil ainda são ilhas isoladas e herméticas, muitas vezes, ideologicamente fechadas. O domínio de uma segunda língua ainda é risível em nosso país.

Por um lado o ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio) sequer mensura o segundo idioma na avaliação dos alunos de “2º Grau”. Por outro, 64% dos estudantes universitários disseram ter “algum conhecimento de inglês” ao ENADE (Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes). Esse exame apontou que 36% dos universitários não têm nenhum conhecimento desse idioma, portanto. Pouco se sabe do resto da população.

O fato é que o Brasil ainda encontra-se distanciado, e faz – portanto – um uso limitado da Internet. Segundo o Internet World Stats, as três línguas mais utilizadas na rede são o Inglês (29%), o Mandarim (19%) e o Espanhol (8%). O português representa 4% desse universo.

O professor e criador do Mídia Lab do MIT (Massachusetts Institute of Technology), atualmente o “pai do lap top de U$ 100”, Nicolas Negroponte, concedeu entrevista para a Revista @prender. Negroponte é um visionário e principal referência mundial sobre tendências e novas tecnologias. Na época solicitei-lhe que projetasse as principais revoluções tecnológicas das próximas cinco décadas, e obtive como resposta que em “2010 teríamos em todos os lugares computadores operando com Banda Larga e sem fios” e que “até 2020 a tradução da linguagem será tão boa e natural quanto a do próprio ser humano”(1). Frente à popularização da telefonia 3G e mais recentemente dos NetBooks (além da modernização dos programas de tradução oferecidos on line como o Babylon e a Ferramentas de Idiomas do Google), fica fácil acreditar que algum aparelho surja em breve tornando possível uma conversa – em tempo real – entre pessoas de nacionalidades e línguas absolutamente distintas.

O Brasil pode viver isolado idiomaticamente a espera de novas tecnologias que suplantem o déficit do ensino da segunda língua em nosso país e abram os 96% da rede para o nosso povo.

Ainda que essa seja uma barreira, é possível falar e pensar hoje na troca de conhecimentos entre salas de aula de todo o planeta. Inclusive de salas de aula do Brasil com o mundo. Algumas iniciativas podem ser adotadas em curto prazo. Imediatamente para o professor sensibilizado com a importância de formar cidadãos do mundo desde as primeiras séries do ensino fundamental.
Escolas Irmãs

O conceito de escolas irmãs não é novo. No Brasil esse é o nome, inclusive, de um programa do Ministério da Educação, que o propõem como “uma rede de colaboração mútua entre escolas que estabelecem parcerias, com o objetivo de compartilhar experiências e trocas pedagógicas, enfatizando a vivência de valores universais e os ideais de solidariedade humana”. O MEC propõe uma rede de escolas tupiniquins, mas muitas instituições podem transgredir barreiras e aventurar-se na prospecção de “irmãs” em todo o planeta. Com as novas ferramentas de relacionamento, como Instant Messengers e redes sociais, os educadores podem montar redes de salas de aula globais com escolas de todo o mundo.
Quebras de Barreiras Idiomáticas

Os educadores devem apropriar-se de novas línguas de forma a multiplicar seu universo de pesquisa. Devem aventurar-se por textos em outros idiomas e abusar das ferramentas de tradução, ainda experimentais, mas – já – muito eficazes.
Utilização de Novas Tecnologias

Uma nova tendência mundial merece destaque nesse artigo. A Open Learning Iniciative é uma rede mundial de universidades de primeira linha – coincidentemente encabeçadas pelo MIT, que propõem a derrubada das barreiras de acesso ao conhecimento pela Internet. Dezenas de instituições de ensino em todo o planeta vêm divulgando conteúdos por meio de mídias diversas na rede, para ser consumido por interessados de todos os países. Uma força democratizadora de conhecimento que irá tornar-se popular em poucos anos.

O fato é que as comportas do intercambio de inteligência, boas práticas e tecnologias pedagógicas abriram-se para os educadores interessados em – de fato e objetivamente – ampliarem suas dinâmicas abrindo-se para um mundo de oportunidades. Com trocadilhos!

(1) Em tempo: Negroponte previu ainda, sob a ressalva de que se tratavam de palpites e que acontecerão progressivamente, que até 2030 existirão implantes no corpo e no cérebro para comunicação direta e argumentação com os computadores, que até 2040 iremos fazer arquivos de mentes para imortalidade e que até 2050 iremos teletransportar objetos.

Creative Commons License
Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons

BLOGOSFERA O uso jornalístico dos blogs

Os weblogs, comumente chamados de blogs, surgiram como um diário pessoal na internet, um lugar para escrever e divulgar coisas de interesse íntimo e opiniões. Essa ferramenta digital ainda é usada para essa finalidade, porém vem se expandido e sendo incorporada também com outros objetivos, mercadológicos. Os blogs atualmente têm sido preferencialmente desenvolvidos por empresas de mídia para informar mais, dar continuidade ao material divulgado na TV, revista, jornal ou rádio. É o jornalismo fazendo uso do blog.O blog pode ser atualizado e editado várias vezes diariamente, sem limite aparente de conteúdo. Isso gera uma grande facilidade para as redes de comunicação divulgarem mais sobre os assuntos que cobrem. Tem ainda a vantagem da interação entre o autor do blog e o leitor. Na seção de comentários de leitores, disponibilizada nos blogs, pode-se criticar, acrescentar informações, elogiar, corrigir, enfim, falar com o responsável pelo material divulgado com muito mais facilidade, ajudando a manter o espaço sempre atualizado. Isso é importante também para a formação do blog. Saber o que o leitor quer ler e como quer é fundamental para que qualquer meio atraia cada vez mais leitores.

Blogueiros e jornalistas

Outra utilização do blog feita pelos jornalistas e outros membros de empresas de comunicação é como mecanismo de opinião. No jornalismo online, em geral, há maior divulgação de conteúdo opinativo, mas no blog isto está mais caracterizado pela existência de discussão contínua sobre o que é divulgado nos textos, incluindo o uso de comentários dos leitores para a criação de novos posts. Assim, até a própria linguagem empregada virtualmente termina por se diferenciar daquela encontrada no jornal impresso. Percebe-se maior intimidade entre autor e leitor – afinal, seu escritor tem mais nítido com quem está dialogando.

Grandes empresas jornalísticas mantêm em seus sites blogs de seus profissionais. O site Zero Hora.com, por exemplo, apresenta uma variedade de páginas para cada assunto, onde jornalistas e comentaristas da organização divulgam diariamente notícias que não ganham espaço na versão em papel, aprimoram o conteúdo do jornal ou manifestam suas opiniões. Além disso, ainda há as páginas virtuais temporárias, feitas exclusivamente para cobrir algum fato importante que está acontecendo em um dado período, como os vários blogs que tratavam dos Jogos Olímpicos de Pequim.

Contudo, todo esse uso que as grandes mídias estão fazendo desse instrumento começou após a invenção dos diários digitais. No seu início, os weblogs eram feitos pelos adolescentes usuários da internet, que se serviam deles literalmente como diários, onde escreviam os acontecimentos do dia-a-dia, suas reflexões e frustrações. Havia também os blogs temáticos, que reuniam um grupo de pessoas com os mesmos gostos sobre variados assuntos. Os próprios jornalistas, no princípio, não viam os blogs com bons olhos. Qualquer um poderia criar uma página e publicar notícias iguais ou muito semelhantes às disponibilizadas pelos jornais online. Havia um embate entre os blogueiros conhecidos e jornalistas formados – um lado alegando liberdade para se expressar e o outro exigindo profissionalismo na divulgação de notícias.

Interação direta com o cliente

Atualmente, quem não está muito contente com o uso feito dos blogs são os seus antigos usuários. O diário digital ganhou popularidade entre as empresas de comunicações que, em sua grande maioria, mantêm vários blogs de seus profissionais. Os tradicionais utilizadores, que os mantinham para fazer confidências a parentes e amigos, perderam espaço para os grandes blogs, cujas visitas chegam a mais de um milhão por mês. Por mais que esse ambiente seja visto pelos leitores de blogs jornalísticos como uma forma mais próxima do autor, os donos das páginas desbancadas perceberam que os blogs se tornaram mais uma ferramenta para garantir lucro aos grandes grupos midiáticos. A intimidade que eles tinham com os leitores do blog foi alterada.

Enquanto isso, cada vez mais as empresas jornalísticas, e mesmo companhias fora do ramo da comunicação, investem nesse novo meio de passar informação, conhecimento e, além de tudo, de interação direta com o cliente. No entanto, sem deixar de lado as potencialidades tradicionais da mídia, que ainda são as que atingem maior número de pessoas.


Creative Commons License
Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons

DIPLOMA DE JORNALISMO

Debate na USP isola as falácias

Reproduzido do blog Laudas Críticas, título original “Debate na USP isola falácias sobre exigência de diploma”

O debate “Obrigatoriedade do diploma”, realizado na noite de quinta-feira (6/11) na Escola de Comunicações e Artes da USP, foi um grande avanço nessa polêmica que se intensificou no Brasil a partir da Ação Civil Pública de outubro de 2001, proposta pelo Ministério Público Federal de São Paulo. Parte da programação da Semana de Jornalismo 2008 da ECA-USP e organizado por estudantes dessa escola, o encontro, que aconteceu no Auditório Freitas Nobre, do Departamento de Jornalismo e Editoração, proporcionou o entendimento sobre os equívocos e falácias que permeiam as discussões sobre esse tema.

Ao participar desse evento, tive a satisfação de ter como colegas de mesa Pedro Pomar, editor da Revista Adusp (da Associação dos Docentes da USP) e membro da oposição do Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo, e Maria Elisabete Antonioli, professora de jornalismo da Universidade Ibirapuera e das Faculdades Integradas Rio Branco. A direção da mesa foi exercida por Paula Sacchetta, aluna do segundo ano de Jornalismo. (Em resposta à pergunta que já deve ter surgido na cabeça muitos leitores, aqui vai a resposta: sim, ela é parente – neta -do incomparável Hermínio Sacchetta).

O mais importante do debate foi o interesse dos debatedores nos argumentos contrários. Diferentemente do que tem sido registrado dos encontros entre antagonistas dessa polêmica, em que predomina o exercício de se dirigir somente às suas próprias platéias, ali foi possível uma discussão ponto a ponto de diferentes aspectos da exigência da formação superior específica em jornalismo estabelecida no Brasil por meio do decreto-lei nº 972, de 17/10/1969.

Mais que ressaltar os principais embates ocorridos nessa discussão, vale a pena destacar os consensos nela obtidos. Teremos muito a ganhar em novos debates presenciais ou virtuais se esses pontos forem, se não seguidos, pelo menos conhecidos. Tento resgatá-los a seguir, e coloco-me à disposição de Pomar, Elisabete e dos demais presentes ao debate para corrigir eventuais equívocos.

Os consensos

1. Não à desqualificação dos oponentes. Como bem destacou Pomar, tem sido inadequado o procedimento da Fenaj (Federação Nacional de Jornalistas) de reduzir à mera defesa de interesses patronais as críticas à obrigatoriedade do diploma. Em contrapartida, a defesa dessa exigência não pode ser identificada automaticamente com a defesa de interesses corporativistas de sindicatos, donos de faculdades particulares ou professores de jornalismo. Do ponto de vista lógico, esses expedientes consistem no apelo à falácia do Argumentum ad hominem.

2. O decreto-lei e a Junta Militar. Não é válido o argumento de que a obrigatoriedade do diploma não é legítima porque foi estabelecida pelos ministros militares que governaram o país em 1969. Não se pode desconsiderar, como bem destacou Maria Elisabete, o fato de que várias reivindicações foram levadas meses antes por sindicalistas ao governo. (A esse respeito, vale a pena ler o artigo o artigo “Liberdade de expressão e regulamentação profissional”, de José Carlos Torves, publicado em 26/8/2008 neste Observatório da Imprensa.) No entanto, divergi dos outros dois debatedores ao observar que pode e deve ser explorado juridicamente o fato de esse decreto-lei não se basear em nenhuma outra lei, mas somente no AI-5 e no AI-16, revogados desde 1979.

3. Não confundir a formação com sua exigência. Deve-se evitar a expressão “contra o diploma”. O que está em questão não é a formação, mas a sua obrigatoriedade. Melhor dizendo, a obrigatoriedade da formação superior específica em jornalismo para o exercício dessa profissão. A ressalva pode parecer óbvia, mas a divisão simplória entre “favoráveis ao diploma” e “contrários ao diploma” tem servido para potencializar equívocos, principalmente entre aqueles que estão pouco informados sobre a questão.

4. Jornalismo não é só prática. Não é verdade que o jornalismo se aprende somente com a prática. Esta não é suficiente para o exercício da profissão de acordo com seus preceitos éticos e técnicos. Além disso, o jornalismo exige boa formação cultural e humanística. A divergência responsável entre favoráveis e contrários à obrigatoriedade está na forma com a qual deve ou pode ser obtida ou comprovada essa formação.

5. Qualidade dos cursos não serve como argumento. A afirmação de que os cursos de jornalismo, em sua maioria, são ruins não serve para invalidar a sua obrigatoriedade. Esse argumento pode justificar a suspensão ou o fechamento caso a caso de cursos de qualquer área, mas não o fim de sua obrigatoriedade.

6. Não confundir opinião com jornalismo. Muitos dos que são contra a obrigatoriedade do diploma se equivocam ao usar artigos opinativos de especialistas como exemplos de bons trabalhos jornalísticos. O decreto-lei 972/1969 não impede que especialistas de outras áreas escrevam como convidados ou colaboradores. O que está em questão é se só a formação superior em jornalismo pode preparar alguém para exercer funções exclusivamente jornalísticas, como as de repórter, redator, editor e outras.

7. Ideologização e falta de verificação. Muitos daqueles que evitam o debate alegam que ele é “ideologizado”. No entanto, seja no sentido amplo ou no específico do termo “ideologia”, não é possível evitar aspectos ideológicos na discussão. O ponto relevante é que muitas manifestações têm sido feitas sem preocupação com a verificação e a análise de suas premissas. Nesse sentido, é correto afirmar, como Rogério Christofoletti em seu blog Monitorando, que a “Discussão sobre o diploma está muito ideologizada” (grifo meu).

8. Não confundir exigência do diploma com regulamentação. A profissão de jornalista é regulamentada em muitos dos países em que não há o requisito de formação superior específica para ela. Enquanto o STF (Supremo Tribunal Federal) não se pronuncia sobre essa exigência e sobre a Lei de Imprensa, poderíamos avançar na discussão sobre os diversos modelos de regulamentação vigentes.

9. O debate não deve se restringir ao aspecto constitucional. Em que pese o fato de o tema estar prestes a ser julgado pelo STF, a discussão não deve ser restrita à tese da não recepção do decreto-lei 972 pela Constituição Federal de 1988 (art. 5º, incisos V e XIII). É preciso também debater em seu mérito a exigência da graduação específica em jornalismo.

As divergências

É neste ponto que começam as divergências sobre as premissas dos debatedores. Nem mesmo o próprio Recurso Extraordinário 511961, do Ministério Público Federal de São Paulo, a ser apreciado por essa Corte, incorre na limitação do tema ao aspecto constitucional, na medida em que apela para outros dispositivos com força de lei no Brasil. Tratam-se da Declaração Universal dos Direitos Humanos, das Nações Unidas, e da Convenção Americana de Direitos Humanos, da Organização dos Estados Americanos:

Declaração Universal dos Direitos Humanos. Artigo XIX.

“Todo ser humano tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e idéias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras.”

Convenção Americana Americana de Direitos Humanos. Artigo 13.

“Liberdade de Pensamento e de Expressão

1. Toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento e de expressão. Esse direito compreende a liberdade de buscar, receber e difundir informações e idéias de toda natureza, sem consideração de fronteiras, verbalmente ou por escrito, ou em forma impressa ou artística, ou por qualquer outro processo de sua escolha.

2. O exercício do direito previsto no inciso precedente não pode estar sujeito a censura prévia, mas a responsabilidades ulteriores, que devem ser expressamente fixadas pela lei a ser necessárias para assegurar:

a) o respeito aos direitos ou à reputaçào das demais pessoas; ou

b) a proteção da segurança nacional, da ordem pública, ou da saúde ou da moral públicas.

3. Não se pode restringir o direito de expressão por vias ou meios indiretos, tais como o abuso de controles oficiais ou particulares de papel de imprensa, de freqüências radioelétricas ou de equipamentos e aparelhos usados na difusão de informação, nem por quaisquer outros meios destinados a obstar a comunicação e a circulação de idéias e opiniões.”

Omissão de professores

Ressaltei no debate aquilo que já disse várias vezes em meu blog e em outros espaços: não se vêem respostas dos acadêmicos defensores da obrigatoriedade a diversas contestações explícitas a essa exigência, principalmente a manifestações de importantes teóricos da comunicação. Com essa omissão, eles, na condição de docentes e pesquisadores, renunciam a exercer plenamente o ethos acadêmico e, na condição de jornalistas, renunciam ao debate de idéias.

Um exemplo de estudioso da comunicação muito respeitado no Brasil e no mundo, e contrário à obrigatoriedade do diploma é Daniel Cornu, professor do Instituto de Jornalismo e Comunicação, da Universidade de Neuchâtel, de Lausanne, e diretor do Centro Franco-Suíço de Formação de Jornalistas, de Genebra. Mas não se vêem contestações à afirmação dele de que…

“O jornalismo é uma ‘profissão aberta’, que não exige formação específica ou diploma. Sua definição é tautológica: é considerado jornalista quem exerce sua atividade principal na imprensa escrita ou nos meios de comunicação audiovisuais. Mais precisamente, são reconhecidos como jornalistas os agentes da mídia, independentemente dos meios ou técnicas de expressão utilizados, que satisfaçam três critérios: a concepção e realização de uma produção intelectual, uma relação deste trabalho com a informação, além do critério de atualidade.” (Daniel Cornu. Ética da Informação. Tradução de Laureano Pelegrin. Bauru: Editora da Universidade do Sagrado Coração, 1998, pág. 19.)

Apontei vários exemplos de omissões desse tipo nas postagens “Os defensores do diploma e seus debates imaginários”, de 08/08/2008, “A liberdade de expressão e o diploma de jornalismo”, de 16/09/2008, assim como no artigo “Diploma de jornalismo”, publicado em 24/06/2005 na Revista Consultor Jurídico e também em 27/06/2005 no Observatório da Imprensa.

Condição necessária

Além desse argumento de ordem jurídica, apresentei outro, o de que a formação superior específica em jornalismo não é condição necessária – muito menos condição suficiente – para o exercício dessa profissão com base em seus preceitos técnicos e éticos. (Sobre os princípios éticos do jornalismo, Pomar ressaltou que não conseguiu aprovar em um dos congressos da Fenaj sua proposta de vedar, no Código de Ética, a participação de jornalistas em propagandas com fins comerciais.)

Se uma pessoa tem as qualificações mínimas para exercer a medicina, a engenharia, a odontologia, a veterinária e várias outras profissões, é porque ela teve formação específica nas respectivas áreas. Ou seja, é impossível neste início de século 21, ter tais qualificações sem ter estudado na respectiva área acadêmica. Nesses casos, a formação superior específica é condição necessária para o exercício de tais profissões. Por isso, justifica-se sua obrigatoriedade nos termos do inciso XIII do artigo 5º da Constituição.

No entanto, se uma pessoa tem as qualificações mínimas para exercer o jornalismo, não podemos afirmar que ela necessariamente estudou jornalismo, o que é atestado pelo que acontece em quase todo o mundo. O mesmo se aplica à publicidade, à administração (que é exercida também por economistas, engenheiros e formados em outras áreas) à música, às artes cênicas. Isso quer dizer que a formação superior específica não é condição necessária para o exercício dessas profissões. E é por isso que não se deve exigir formação superior específica para elas.

Falácia recorrente

Apesar de sua inegável disposição para a discussão, meus dois colegas debatedores da mesa não apontaram, em suas respostas às questões levantadas por mim e por alguns dos presentes ao debate, quais são as qualificações necessárias para o jornalismo que seriam obtidas exclusivamente por meio da formação superior específica. Minha tese é a de que esse ponto, que nunca foi provado, sempre teve status de dogma. E foi o que sempre esteve por trás da confusão recorrente do jornalismo com profissões que exigem qualificações obtidas necessariamente por meio de cursos superiores específicos. Sem falar nos argumentos do tipo “então tem de abolir também o diploma de médico, engenheiro…”.

Reconheci no debate que, apesar da correção lógica desse argumento, não dá para convencer muitos dos defensores da obrigatoriedade do diploma a aceitá-lo. Mas ele deixa claro que é deles o ônus de uma complicada prova – que na minha opinião é impossível. Portanto, a alegação de que muitos críticos da obrigatoriedade confundem direito de expressão e exercício profissional se baseia em uma premissa: a de que a formação específica é condição necessária para qualificações exigidas pela profissão. Mas é justamente isso o que deveria ser discutido. Em outras palavras, essa alegação incorre naquilo que em lógica se chama falácia da petição de princípio.

Agradeço aos alunos da ECA-USP pela oportunidade de discutir esse assunto e pelo ambiente agradável que proporcionaram para isso. Agradeço também aos outros dois debatedores que participaram do evento: eles ressaltaram aspectos relevantes sobre a exigência do diploma e mostraram que o debate civilizado de idéias é possível mesmo em torno de um tema altamente polêmico como esse.

* Matéria de Maurício Tuffani, Jornalista especializado em ciência e meio ambiente, editor do blog Laudas Críticas.

Publico aqui na íntegra o conteúdo que lí no site ” Observatório da Imprensa” porque são informações de extrema importância para mim, para os colegas e pertinentes a nossa carreira.

Manter um blog seu na empresa é trabalho?

No fundo, a inquietação é: blog corporativo é trabalho?

“Se já não tenho tempo para nada, ainda vou blogar?”.

A idéia de uma máquina para cada pessoa, “meu HD”, “meus arquivos”, está desaparecendo na web, com a chegada das ferramentas do Google Desktop e similares.

O meu micro será em rede, os aplicativos rodarão lá e meus arquivos ficarão ali. Este é o caminho mais provável, pois é mais barato, dinâmico e eficiente.

Bom, então não haverá tanto mais a minha máquina, mas, sim meu espaço em rede.

A outra constatação é de que a presença do empregado em rede ainda não está consolidada nas organizações.

Hoje, as empresas vivem ainda o período pré-web 2.0, no qual não há “redes de amigos”, aquilo que o Orkut (e as redes sociais) trouxeram de melhor para a web.

Essa personalização e essa explicitação de forma fácil das redes de contatos e da minha produção resumem tudo que o pessoal da gestão de conhecimento sempre sonhou… e que a rede deu uma resposta simples: redes sociais, ou como os donos do My Space estão preferindo denominar, portais sociais.

Falei sobre camadas inteligentes, sugiro ler depois.

Eu sou fulano, minha foto, meus amigos, meus interesses, meus arquivos. Note os nomes de alguns sites: Facebook, “minha cara lá”, ou MySpace, o “meu espaço lá”.

O trabalho intelectual que é feito pelos empregados que trabalham diante de um computador passará por esta fase.

As redes de pessoas começarão a invadir as empresas, tirando-as das ilhas e colocando-as em contato com os outros. A idéia, assim, da minha máquina e da falta de visibilidade em rede tende a diminuir gradualmente.

O ambiente corporativo terá o link para o blog de cada um com todos os dados, localização física, onde a pessoa trabalha, o que está fazendo hoje, o que fez ontem, o que produziu no último ano, quem são seus contatos mais usuais, o que ela gosta, o que está estudando, o que vai estudar, o que lê, o que fotografou a serviço, que links sugere, que vídeos, que cursos fez ou quer fazer…

Tudo isso em rede, com possibilidade de comentários, acompanhamento, links, interação etc. Basta olhar a web aqui fora hoje… o que está bombando aqui vai para dentro das empresas amanhã, como já ocorreu com o e-mail e os portais. Há empresas já trabalhando assim e vamos ter esse ambiente como padrão no Brasil nos próximos cinco anos…

Aqui no país um bom case é o da IBM. Vejam, por exemplo, o blog do Taurion. Sugiro também algumas apresentações do software colaborativo da IBM, o Lotus Conection.

Ou seja, o nosso trabalho intelectual tem um resultado final: uma apresentação, um relatório, uma planilha, um documento, qualquer coisa.

E esse trabalho será feito da mesma maneira, mas o resultado será publicado no seu espaço, e/ou da sua equipe, e/ou no do seu setor, em uma ambiente de conhecimento em rede.

Note bem, o que produzimos basicamente são registro digitais.

Estes registros hoje não são bem trabalhados, não entram de forma inteligente em um fluxo, não só para rápida recuperação, o que até tem avançando com as ferramentas atuais de disseminação, mas ainda carecem de uma rápida e eficiente colaboração.

A informação tem que rolar o tempo todo, tendo a cada momento sendo acrescida de “pitacos” por cada um dos participantes da rede para ir aumentando a sua relevância para quem vai chegar depois.

E ainda uma melhor coordenação de esforços para evitar que tarefas repetidas e pouco inteligentes (para não dizer burras) sejam cada vez mais evitadas, pois é dinheiro sendo jogado fora pela janela. O capital intelectual é caro!

Assim, o blog de cada um não será o de dois espaços: um, o trabalho e outro a colaboração. Essa é uma visão precipitada do processo.

Eu produzirei e publicarei no meu blog, dentro de uma rede social da minha empresa, na qual todos estarão trocando e colaborando, como uma colméia, de forma mais eficiente do que é hoje, aumentando o uso do capital intelectual.

Assim, o blog será o que é hoje o nosso HD, com a possibilidade, a gosto de cada um, de poder escrever também suas experiências, como estou fazendo aqui depois dessa palestra.

Usando este espaço para reflexão, possíveis interações e documentando idéias que, talvez, se não tivessem sendo colocadas em rede, se perdessem no dia-a-dia.

Por fim, o que vale agora é a nossa capacidade de pensar, se articular e transformar tudo isso em algo de valor. Esse é o desafio dos novos ambientes de conhecimento corporativo…

Você concorda ?

Carlos Nepomuceno é professor, pesquisador e co-autor do livro Conhecimento em Rede (Editora Campus), coordenador do ICO, Instituto de Inteligência Coletiva e diretor da Pontonet. Mais dele no blog CNepomuceno e no Twitter.